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A arte da pesca e os desafios da profissão​

Por Farley Aguiar e Lucas Pessoa

A profissão de pescador é uma das mais antigas do mundo. Ela exige gosto pela vida marinha, flexibilidade, agilidade, capacidade de concentração e observação, e, claro, habilidade com os instrumentos de pesca. Vale ressaltar que o interesse dos pescadores não se limita aos peixes. Interessam também lagostas, camarão, lula e muito mais.

No caso da maioria dos pescadores artesanais, como também são conhecidos os jangadeiros, acordar bem cedo, muitas vezes antes do sol nascer, é necessário para preparar a jangada, linha, anzol, isca... para sair no melhor momento possível. Na maioria das vezes, de madrugada.

“Quanto se trata de ir para o mar pescar, o negocio é sério. Diz o pescador do bairro Mucuripe, José Airton. Aqui, às cinco horas da manhã, tem que está no mínimo duas milhas dentro do mar. Cinco horas da manhã! E, para chegar, não tem hora e nem dia”.

É comum partir no começo da manhã e terminar a jornada no final da tarde, mas os pescadores chegam a passar vários dias em alto mar. Para suportarem tanto tempo, eles costumam embarcar levando alimentos que não exigem muito preparo para o consumo como pão, banana, rapadura, e outros que podem ser preparados em fogareiros instalados nas embarcações.



Atualmente, há quem use GPS para se orientar no mar. No entanto, a maioria usa como referências serras (montanhas), faróis, sinalizadores, dentre outros recursos.



Os riscos da profissão são muitos. Segundo outro pescador do Mucuripe, Adail de Souza, há quem vá trabalhar e não retorna para casa. Ventos e chuvas fortes, relâmpagos, acidentes, são reais e presentes. Por isso, muitos pescadores sequer arriscam trabalhar quando a situação climática não é boa. A dureza desse trabalho chega a interferir diretamente no corpo desses profissionais que se expõem constantemente ao sol forte e à maresia. “Ligeiro ele perde a fisionomia. A dificuldade da visão é o primeiro sintoma que aparece no pescador”, alerta José Airton.


De pai pra filho
Normalmente essa profissão é passada de geração a geração. É o caso do senhor Raimundo Ramos, de 83 anos. Ele começou a pescar aos 12 com o apoio e os ensinamentos de seu pai. “Eu ainda me lembro da primeira vez que eu fui pro mar. Foi num inverno debaixo de um temporal de chuva. Mas, pegamos peixes ‘como um todo’. Nesse tempo tinha muito peixe na costa”, afirma.

 

Atualmente o senhor Raimundo é aposentado e um dos pescadores mais antigos que vive na área do Mucuripe. Trabalhou com a pesca por cerca de seis décadas. Segundo o ex-pescador, o dinheiro adquirido nesse trabalho não é suficiente para sustentar uma família como deveria, porém, ele conseguiu  inicialmente ajudar seus pais na casa em que morava com mais cinco irmãos quando mais novo. Em seguida, sustentou sua família, esposa e oito filhos. Destes, somente um tornou-se pescador, mantendo a tradição.

Representação
Atualmente, no Brasil, para exercer a atividade da pesca profissionalmente é preciso fazer registro no Ministério da Pesca e na Marinha. Com Isso, o pescador passa a ser incluído em políticas públicas e pode contar com benefícios como aposentadoria, segurança e diversos auxílios. Aqui no Ceará são vinte colônias (que vão do município de Icapuí, divisa com o Rio Grande do Norte, até Chaval, divisa com o estado do Piauí) de pescadores artesanais que representam a base sindical da categoria. A colônia do Mucuripe, por exemplo, é a Z-8. Além de lutar pelos direitos garantidos por lei a essa classe profissional, elas são responsáveis por preparar documentos, dar orientações, fazer encaminhamentos sociais em qualquer nível que o pescador precise. Tudo isso, com o apoio de uma Confederação Nacional e de federações estaduais de pescadores.

 

“A Federação das Colônias de Pescadores do Estado do Ceará (Fepesce) é o órgão que faz a representação das colônias cearenses. Ela acompanha passo a passo todas as ações de cada colônia para que a gente possa saber e sentir que o pescador está sendo atendido” – esclarece o presidente da instituição, Raimundo Félix.


Segundo o presidente, existem aproximadamente 50 mil pescadores artesanais registrados no Ceará e cerca de 4 mil em atividade em Fortaleza. Esse número preocupa o Presidente da Federação, pois, segundo ele, a pesca está diminuindo no estado.


“Hoje, a pesca teve uma decadência muito grande e Fortaleza é um exemplo disso, pelo número de embarcações que você vê encostadas na praia, paradas e pela pouca produção que chega do mar para a terra. Isso causa certo desânimo. Antigamente era difícil um filho de pescador querer ir à escola. Hoje é difícil um querer ir para o mar, ele prefere hoje ir para sala de aula”, destaca Raimundo Félix, lamentando pelo futuro da profissão, que não atrai mais os jovens.

 

Quando se refere à figura da jangada, o presidente lembra que ela é fundamental não só para a pesca artesanal, como para carregar a tradição dos pescadores no estado do Ceará. “Um dos nossos governadores disse que a jangada existe como peça de museu, e não é. Nós nunca vamos acabar a tradição da jangada no Ceará. Isso nunca ninguém vai acabar. A não ser que você mude a até a bandeira do Ceará, porque lá tem uma jangadinha. Até no nosso slogan tem uma jangada, não pode faltar. A pesca é como um vício, depois que você se vicia, não sai dela, você gosta e o mar é uma terapia de lazer, de experiência de vida e de trabalho. É duro, mas também satisfatória e prazerosa”, destaca o presidente.



Bairro dos pescadores
Em Fortaleza, o bairro do Mucuripe é um símbolo quando se trata da vida e profissão de pescador artesanal. Originalmente, esse lugar era uma espécie de vila dos pescadores, mas deixou de ser a partir de 1950 quando ficou mais forte a presença industrial e a especulação imobiliária na região. Contudo, os pescadores não saíram de lá, pelo menos não todos. Em geral, eles se reúnem diariamente nas proximidades do Mercado dos Peixes no final da Avenida Beira Mar, ao lado do porto. No entanto, muitos pescadores que ancoram suas jangadas naquela localidade não vendem seus pescados no mercado, pelo contrário, eles negociam diretamente com o cliente na areia da praia. Muitas vezes por um valor abaixo do praticado no comércio formal.

Os jangadeiros normalmente trabalham em equipe. FOTO: Farley Aguiar

Os jangadeiros normalmente trabalham em equipe.

FOTO: Farley Aguiar.

GALERIA DE FOTOS

O senhor Raimundo é morador do Mucuripe há 62 anos.

FOTO: Lucas Pessoa.

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